Monday, November 16, 2009

Por trás da página, uma noite sem neblinas...





Foi quase um suicídio, eu sei. Acordei com Janis ecoando no meu corpo trêmulo: ‘ Trust me, Trust Me!’... Seria um jeito de me fazer desistir do pulo?  A fumaça ainda estava ali, nas cinzas que tinham o hálito quente dele, depois de nossa luta corporal... Sua boca ainda estava acesa em minha carne, onde tatuou benditas palavras obscenas que rasgaram todo resto de pudor que tentava resistir e algemar-me . Agora estava ali, sem saber o que fazia com aquela liberdade de dizer, de sentir...Ele extraíra uma outra mulher de mim , aquela que só tinha coragem de existir naquilo que escrevia. Mas, depois que escrevi no corpo dele, o papel já não me saciava mais. Nenhuma linha seria melhor do que seus pelos, onde minha língua se enrolava e se perdia numa poesia vertiginosa e intraduzível. Seus olhos acendiam o néon vermelho do meu corpo azul, e nossas auras se dissolviam num suor púrpura, quase vinho, que bebíamos como se fosse nosso próprio sangue, uma transfusão que nos salvaria da anêmica vida de antes... Renascíamos naquela cidade construída nas ruínas do meu quarto amarelado, que apenas em uma noite ele pintara de verde, quase mar, quase eu agora, mergulhada nas ondas entre minhas pernas sobre a cama desforrada. Seu grito ainda ecoava dentro de minha boca, engoli cada palavra molhada em minha saliva, foi o ‘eu te amo’ mais bonito que já ouvi! Ele me ensinara a pular o muro e descobrira um país no meu deserto. Deu-me de beber no seu corpo e despertou em mim a felina, que sugou-lhe todo o leite que  me traria a vida de volta, na taça de uma noite sem neblinas...
Não vi a hora em que se foi, era como se tivesse me dopado. Acordei com seu gosto aceso na boca, como o último cigarro de menta que traguei... E a primeira saudade tinha um cheirinho de hortelã...
Chegou e saiu como um gato, sem deixar vestígios. Contudo, agora, eu não ficaria mais em cima do muro, como sempre fiquei, esperando a vida chegar...
Ele ensinara-me o pulo, agora era eu quem iria ao encontro da vida...
Procurei o CD da Janis e liguei o som bem alto! E minha voz se misturou à dela... Finalmente eu acreditava, Janis, eu acreditava!
E no pulso, no lugar do corte, havia crescido asas...
Virei o caos pelo avesso,... Havia mar, de certo, havia mar do outro lado...

(RaiBlue)


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